Monday, October 29, 2007

Meu primeiro (quase) piti

Não me lembro se já contei em algum texto remoto deste blog sobre os pitis públicos que eu já presenciei aqui em Londres.

Uma vez, uma velhinha que estava no mesmo ônibus que a gente apertou o botão pro ônibus parar e ele não parou e passou reto pelo ponto. A velhinha não teve dúvida. Foi até a janelinha do motorista e começou a gritar, não em voz crescente mas de repente mesmo, e tanto e tão alto que o ônibus inteiro levou o maior susto até entender o que estava acontecendo. Segundos depois, a velhinha estava batendo (não estou exagerando, juro) a bengala no vidro da janelinha com tanta força e gritando tanto que eu achei que ia acabar em sangue. O motorista, bem nervosinho também, gritava de volta como se estivesse falando com uma adolescente rebelde. Foi uma cena inacreditável. No final da história, a velhinha acabou descendo no próximo ponto jurando que ia denunciar o "mister driver" (durante toda a pancadaria ela manteve a classe chamando ele o tempo todo só de "mister driver") e tirar a licença dele pra sempre.

Acho que depois dessa, eu vi pelo menos mais uma dezena de cenas assim. O ônibus é o ambiente vencedor, de longe, em números de casos. Mas filas em geral também são bem propícias. A do correio deve ser o segundo lugar (como na vez que uma outra senhora ficou tão revoltada que só tinha um caixa atendendo que ficou meia hora declamando sobre os direitos dos cidadãos que fez o resto da fila esperar ainda muito mais do que já estava esperando com o dito cujo do único caixa). A melhor delas foi um senhor (incrível, quase sempre são pessoas de idade) que estava tão indignado pelo fato de o motorista não ter esperado uma velhinha se sentar pra fazer o ônibus andar, que berrou tanto lá de trás de onde ele estava, que o motorista parou o ônibus até a velhinha se acomodar.

E hoje foi a minha vez.

Desci a escada do ônibus (eu sempre volto no segundo andar vendo a vista) um ponto antes para dar tempo (os londrinos vão rir de mim, mas eu morro de medo de não conseguir descer em cima da hora). Cheguei lá embaixo e apertei o botãozinho pra parar no próximo, que era o meu. E comecei a digitar uma mensagem de texto no celular, muito complexa por sinal, pedindo pro Ricardo pegar meus casacos na lavanderia quando saisse da aula. Quando eu olho... cadê meu ponto? Passou! E o ônibus continuou indo, virando pra cá, virando pra lá, e eu zonza tentando entender o caminho que teria que fazer de volta e ao mesmo tempo sentindo os olhares ao meu redor, ansiosos por uma briga, sedentos por justiça. Eu nunca passei daquele ponto. Nunca fui adiante, e não sabia que o adiante era tão tortuoso e cheio de curvas. E nem que o próximo ponto era tão longe. Não sabia como voltar e já estava razoavelmente tarde e as ruas, a oeste da minha casa, são estritamente residenciais, sem muita luz e cheias de "council buildings" - os prédios populares do estado, cheios de gangues não muito amigáveis. Aí eu lembrei do frio. Aí eu senti um ônibus inteiro olhando pra mim esperando por uma atitude. Eu não podia, simplesmente não podia, descer daquele ônibus quieta como se nada tivesse acontecido. Ia ser uma ofensa não só ao meu orgulho e direito de cidadã como ao orgulho do ônibus inteiro. Do jeito que eles me olhavam, talvez do país inteiro. E lá fui eu bater na janelinha do mister driver.

- "Excuse me".

Mr. Driver só olha pra mim.

- "I pressed the button and you didn`t stop and now I don't know how to go back." (ok, nessa hora eu percebi que estava com o approach totalmente errado, devia estar gritando e xingando e não fazendo cara de coitada).

Mr. Driver continua olhando pra mim sem falar nada. (Será que eu tenho tanta cara de inofensiva, não mereço nem um resmungo de volta? Ele não estava me levando a sério).

- "You didn't stop!!! I pressed the button for you to stop this bus (devia ter colocado um "fucking" ou um "bloody" entre o this e o bus, eu sei) and you didn't!!! (cara de brava, tom de voz elevado, público mais satisfeito)

Mr. Driver balança a cabeça negativamente.

- "How will I go back, now? I don't even know the way back!!!!"

Mr. Driver não fala nada.

E lá vou eu pra porta de saída do ônibus, bufando como uma inglesa que se preze.

Pelo menos eu não decepcionei meus colegas.

Pelo menos eu demonstrei insatisfação.

Tudo bem, eu não ameacei o mr driver de caçar a licensa dele.

Nem xinguei e não falei "fuck" nenhuma vezinha.

Droga, tenho muito o que aprender.

3 comments:

π said...

A-D-O-R-E-I

Anonymous said...

Eu tenho medo dos Mr. Drivers. Eles são mto maus!!
hahahahaah
Na minha curta estada vi os caras espancando até a morte uma pequena criança que passou pela frente!!! haahhaa
Zoeira, mas que eu quase achei que ele ia bater no cara que ficou de pé no 2o. andar eu achei!!

JESUS!!

bjs

Anonymous said...

Ahhhh e tenho que dizer que esse não foi o primeiro pitiii....
HAHAHAHA
WICKED!